A Natureza da Atividade Fruitiva
Sri Krsna Bhagavan
(Excerto do capítulo dez do décimo primeiro canto do Srimad-Bhagavatam)
Ganho inconsistente seguido de perda – Krishna instrui Uddhava acerca do sistema religioso karma-kanda.
Aceitando pleno refúgio em Mim e fixando a mente com atenção no serviço devocional ao Senhor conforme explicado por Mim, deve-se viver sem desejo pessoal e praticar o sistema social e ocupacional chamado varnashrama.
A alma purificada deve ver que, como as almas condicionadas que se dedicam ao gozo dos sentidos aceitaram erroneamente os objetos do prazer sensual como verdade, todos os seus esforços estão fadados ao fracasso.
Quem está dormindo talvez veja num sonho muitos objetos de gozo dos sentidos; tais coisas agradáveis, porém, são meras criações da mente e, por isso, em última análise, são inúteis. Do mesmo modo, a entidade viva que está adormecida para sua identidade espiritual também vê muitos objetos dos sentidos, mas esses inúmeros objetos do desfrute temporário são criações da potência ilusória do Senhor e não têm existência permanente. Quem medita neles, impelido pelos sentidos, ocupa em vão sua inteligência.
Aquele que Me fixou dentro de sua mente como a meta da vida deve abandonar as atividades baseadas no gozo dos sentidos e, em vez disso, deve executar trabalho regido pelos princípios reguladores para o progresso. Quando, porém, alguém se dedica na íntegra à busca da verdade última acerca da alma, não deve aceitar os preceitos da escritura que governam as atividades fruitivas.
Aquele que Me aceitou como a meta suprema da vida deve observar à risca os preceitos escriturais que proíbem atividades pecaminosas e, tanto quanto possível, deve executar os preceitos que ordenam deveres reguladores menores, tais como a limpeza. No final, porém, a pessoa deve se aproximar de um mestre espiritual autêntico que tenha tanto conhecimento acerca de Mim quanto Eu mesmo, que seja pacífico e que, em virtude de sua elevação espiritual, não seja diferente de Mim.
O servo ou discípulo do mestre espiritual deve estar livre do falso prestígio, jamais se considerando o executor. Deve ser ativo e nunca preguiçoso e deve renunciar a todo o sentido de propriedade sobre os objetos dos sentidos, incluindo sua mulher, filhos, lar e sociedade. Deve ser dotado de sentimentos de amizade amorosa para com o mestre espiritual e jamais deve se desviar ou confundir. O servo ou discípulo deve sempre desejar avanço em compreensão espiritual, não deve invejar ninguém e deve sempre evitar conversas inúteis.
Deve-se ver o verdadeiro interesse próprio na vida em todas as circunstâncias e deve-se, portanto, permanecer desapegado de esposa, filhos, lar, terra, parentes, amigos e assim por diante.
Assim como o fogo, que queima e ilumina, é diferente da lenha, que deve ser queimada para iluminar; de forma semelhante, o vidente dentro do corpo, a alma espiritual autoiluminada, é diferente do corpo material, que deve ser iluminado pela consciência. Logo, a alma espiritual e o corpo possuem características distintas e são entidades separadas.
Assim como o fogo pode aparecer de diversas maneiras, tais como adormecido, manifesto, fraco, brilhante, etc., conforme a condição do combustível; de igual modo, a alma espiritual entra num corpo material e aceita características corpóreas específicas.
Os corpos materiais grosseiro e sutil são criados pelos modos materiais da natureza, que se expandem da potência da Suprema Personalidade de Deus. A existência material acontece quando a entidade viva comete o erro de aceitar que as qualidades dos corpos grosseiro e sutil fazem parte de sua verdadeira natureza. Esse estado ilusório, contudo, pode ser destruído através do conhecimento verdadeiro.
Portanto, mediante o cultivo de conhecimento, a pessoa deve se aproximar da Suprema Personalidade de Deus, que se encontra dentro de si. Compreendendo a existência transcendental e pura do Senhor, deve-se abandonar pouco a pouco a visão errônea de que o mundo material se constitui de uma realidade independente.
Pode-se comparar o mestre espiritual ao graveto inferior; o discípulo, ao graveto superior; e a instrução dada pelo guru, ao terceiro graveto colocado entre eles. O conhecimento transcendental que o guru transmite ao discípulo é comparado ao fogo que surge do contato entre eles, o qual reduz a cinzas a escuridão da ignorância, trazendo grande felicidade tanto ao guru quanto ao discípulo.
Por ouvir submissamente um mestre espiritual perito, o discípulo perito desenvolve conhecimento puro, que rechaça o ataque da ilusão material decorrente dos três modos da natureza material. Esse mesmo conhecimento puro cessa afinal, assim como o fogo acaba quando o estoque de combustível se esgota.
Desse modo expliquei o conhecimento perfeito. Há filósofos, todavia, que desafiam Minha conclusão. Eles afirmam que a posição natural da entidade viva é ocupar-se em atividades fruitivas e veem-na como o desfrutador da felicidade e da infelicidade resultantes de seu próprio trabalho. Segundo essa filosofia materialista, o mundo, o tempo, as escrituras reveladas e o eu são todos variados e eternos, existindo como um fluxo perpétuo de transformações. Além disso, o conhecimento não pode ser único nem eterno, visto que surge das formas diferentes e mutáveis dos objetos; logo, o próprio conhecimento está sempre sujeito a mudanças. Mesmo que se essa filosofia for aceita, haverá ainda perpétuos nascimentos, mortes, velhice e doenças, pois todas as entidades vivas têm de aceitar um corpo material sujeito à influência do tempo.
Embora o executor de atividades fruitivas deseje felicidade perpétua, observa-se claramente que os trabalhadores materialistas muitas vezes estão infelizes e apenas vez por outra se encontram satisfeitos, provando assim que eles não são independentes nem controlam seu destino. Quando um homem está sempre sob o controle superior de outrem, como pode ele esperar algum resultado valioso de suas próprias atividades fruitivas?
Observa-se no mundo material que às vezes nem mesmo uma pessoa inteligente é feliz. De modo semelhante, às vezes mesmo um grande tolo é feliz. O conceito de tornar-se feliz através da perita execução de atividades materiais é apenas uma exibição inútil de falso egotismo. Mesmo que saibam como alcançar a felicidade e evitar a infelicidade, as pessoas ainda não conhecem o processo pelo qual a morte não poderá exercer seu poder sobre elas. A morte não é em nada agradável, e como todos são exatamente como um condenado sendo levado ao local da execução, que felicidade é possível extrair dos objetos materiais ou do prazer que eles proporcionam?
Aquela felicidade material da qual ouvimos falar, tal como a promoção aos planetas celestiais em busca de desfrute paradisíaco, é tal qual a felicidade material que já experimentamos. Ambas são contaminadas pelo ciúme, inveja, decadência e morte. Portanto, assim como o esforço para produzir uma safra torna-se infrutífero caso haja muitos problemas, tais como doença das plantas, praga de insetos ou seca, de forma semelhante, o esforço para alcançar a felicidade material, quer na Terra, quer nos planetas celestiais, é sempre infrutífero por causa de inúmeros obstáculos.
Se alguém executa sacrifícios védicos e rituais fruitivos sem nenhum engano nem contaminação, alcança uma situação celestial na próxima vida. Porém, mesmo esse resultado, que só é conseguido através da execução perfeita de rituais fruitivos, será vencido pelo tempo. Agora, ouve sobre isso.
Se alguém na Terra executa sacrifícios para a satisfação dos semideuses, ele vai para os planetas celestiais onde, tal qual um semideus, desfruta todos os prazeres celestiais que ganhou em virtude de suas execuções. Tendo alcançado os planetas celestiais, o executor de sacrifícios ritualísticos viaja num aeroplano reluzente, que obtém como resultado de sua piedade na Terra. Glorificado por canções cantadas pelos gandharvas e vestido com maravilhosas roupas encantadoras, ele desfruta a vida rodeado de deusas celestes.
Acompanhado de mulheres celestiais, o desfrutador dos resultados de sacrifício parte em viagens paradisíacas num maravilhoso aeroplano, decorado com círculos de sinos tilintantes, que voa para onde quiser. Estando confortável, à vontade e feliz nos aprazíveis jardins celestiais, ele não considera que estão esgotando os frutos de sua piedade e que logo cairá no mundo mortal.
Até que se gastem seus resultados piedosos, o executor de sacrifícios desfruta a vida nos planetas celestiais. Quando se esgotam os resultados piedosos, porém, ele cai dos aprazíveis jardins celestes, sendo levado contra a vontade pela força do tempo eterno.
Se um ser humano se ocupa em atividades irreligiosas e pecaminosas, seja em decorrência de más companhias, seja por não conseguir controlar os sentidos, com certeza desenvolverá uma personalidade cheia de desejos materiais. Ele, então, se torna avarento com os outros, ganancioso e sempre ansioso por explorar os corpos das mulheres. Quando a mente fica assim tão poluída, ele se torna violento e agressivo e, sem a autoridade dos preceitos védicos, abate animais inocentes em prol do gozo dos sentidos. Adorando fantasmas e espíritos, o homem perplexo cai de vez nas garras das atividades desautorizadas e por isso vai para o inferno, onde recebe um corpo material contaminado pelos mais tenebrosos modos da natureza.
Nesse corpo degradado, ele infelizmente continua a executar atividades inauspiciosas, que aumentam enormemente sua futura infelicidade, e por isso torna a aceitar um corpo material semelhante. Que felicidade há de ter para quem se entrega a atividades que inevitavelmente terminam em morte? Em todos os sistemas planetários, desde os celestiais até os infernais, e para todos os grandiosos semideuses que vivem por mil ciclos de yuga, existe o medo de Mim sob Minha forma do tempo. Mesmo Brahma, que possui a suprema duração de vida de trezentos e onze trilhões e quarenta bilhões de anos, também tem medo de Mim.
Os sentidos materiais criam atividades mundanas, piedosas ou pecaminosas, e os modos da natureza põem os sentidos materiais em ação. A entidade viva, estando plenamente ocupada pelos sentidos materiais e modos da natureza, experimenta os vários resultados do trabalho fruitivo.
Enquanto pensa que os modos da natureza material têm existência separada, a entidade viva é obrigada a nascer em muitas formas diferentes e experimentar variedades de existências materiais. Portanto, a entidade viva permanece completamente dependente das atividades fruitivas sob os modos da natureza.
A alma condicionada que, sob os modos da natureza material, permanecer dependente das atividades fruitivas continuará a ter medo de Mim, a Suprema Personalidade de Deus, já que Eu lhe imponho os resultados das atividades fruitivas. Aqueles que aceitam o conceito de vida material, tomando como real a variedade dos modos da natureza, dedicam-se ao desfrute mundano e por isso estão sempre absortos em lamentação e pesar.
.
Se gostou deste material, também gostará destes: Dívidas, O Melhor Processo para Aperfeiçoamento da Vida, Ida e Volta ao Inferno.
.
Se gostou deste material, também gostará do conteúdo destas obras:
Pingback: Artigos e Palestras | Volta ao Supremo | Página oficial